Origem e natureza dos Espíritos
76 — Que definição se pode dar dos Espíritos?
— Pode-se dizer que os Espíritos são os seres inteligentes da criação. Povoam o universo, além do mundo material.
NOTA: A palavra Espírito é usada aqui para designar as individualidades dos seres extracorpóreos, e não o princípio inteligente universal.
77 — Os Espíritos são seres distintos da Divindade ou simples emanações dela, sendo por isso chamados filhos de Deus?
— São obra de Deus, assim como uma máquina é obra do ser humano que a fabrica. A máquina é criação do homem, não é o próprio homem. Quando alguém faz algo belo e útil, costuma chamá-lo de sua criação. Do mesmo modo, somos filhos de Deus porque somos obra dele.
78 — Os Espíritos tiveram um princípio ou existem, como Deus, desde toda a eternidade?
— Se não tivessem tido um princípio, seriam iguais a Deus. No entanto, são criação dele e estão submetidos à sua vontade. Deus existe desde sempre, isso é incontestável. Quanto à forma e ao momento em que fomos criados, nada sabemos. Pode-se dizer que não tivemos princípio apenas no sentido de que, sendo Deus eterno, ele sempre criou sem cessar. Mas quando e como cada um de nós surgiu, isso ninguém sabe: aí está o mistério.
79 — Considerando que existem dois elementos gerais no universo — o elemento inteligente e o elemento material — pode-se dizer que os Espíritos são formados do elemento inteligente, assim como os corpos inertes o são do elemento material?
— Sim. Os Espíritos são a individualização do princípio inteligente, assim como os corpos são a individualização do princípio material. A época e o modo como isso ocorreu nos são desconhecidos.
80 — A criação dos Espíritos é permanente ou ocorreu apenas na origem dos tempos?
— É permanente. Deus nunca deixou de criar.
81 — Os Espíritos se formam espontaneamente ou procedem uns dos outros?
— Deus os cria, como cria todas as outras coisas, por sua vontade. Mas a origem deles permanece um mistério.
82 — É correto dizer que os Espíritos são imateriais?
— Como definir algo quando faltam termos de comparação e a linguagem é limitada? Um cego de nascença conseguiria definir a luz? “Imaterial” não é o termo mais adequado; “incorpóreo” seria mais preciso. Sendo uma criação, o Espírito é algo real. Trata-se de uma forma de matéria extremamente sutil, sem analogia com o que vocês conhecem, tão etérea que escapa completamente aos sentidos.
Dizemos que os Espíritos são imateriais porque sua essência difere de tudo o que chamamos de matéria. Um povo de cegos não teria palavras para expressar a luz e seus efeitos. Da mesma forma, somos como cegos diante da essência dos seres que estão além de nós. Só conseguimos defini-los por comparações sempre imperfeitas ou por esforço da imaginação.
83 — Os Espíritos têm fim? Suas individualidades se dissolvem com o tempo, como acontece com os corpos materiais?
— Há muitas coisas que vocês não compreendem porque a inteligência humana é limitada. Isso, porém, não é motivo para rejeitá-las. A existência dos Espíritos não tem fim. É tudo o que podemos dizer, por enquanto.
Mundo normal primitivo
84 — Os Espíritos constituem um mundo à parte daquele que vemos?
— Sim, o mundo dos Espíritos, ou das inteligências incorpóreas.
85 — Qual dos dois mundos é o principal, na ordem das coisas: o mundo espírita ou o mundo corporal?
— O mundo espírita, que existe antes de tudo e sobrevive a tudo.
86 — O mundo corporal poderia deixar de existir sem que isso afetasse o mundo espírita?
— Sim. Eles são independentes; no entanto, existe uma relação constante entre ambos, pois um reage continuamente sobre o outro.
87 — Os Espíritos ocupam uma região específica e delimitada no espaço?
— Estão em toda parte. Povoam os espaços infinitos. Estão continuamente ao lado de vocês, observando-os e influenciando-os, sem que vocês percebam. Os Espíritos são uma das forças da natureza e instrumentos de que Deus se serve para realizar seus desígnios. No entanto, nem todos podem ir a todos os lugares, pois há regiões inacessíveis aos menos evoluídos.
Forma e ubiquidade dos Espíritos
88 — Os Espíritos têm forma determinada, limitada e constante?
— Para vocês, não; para nós, sim. O Espírito pode ser comparado a uma chama, um clarão ou uma centelha etérea.
— Essa chama ou centelha tem cor?
— Tem uma coloração que, para vocês, varia do tom escuro e opaco a um brilho intenso, semelhante ao rubi, conforme o Espírito seja mais ou menos puro.
A representação simbólica de gênios com uma chama ou estrela na fronte é uma alegoria da natureza dos Espíritos, colocada na cabeça por ser ali a sede da inteligência.
89 — Os Espíritos levam tempo para se deslocar no espaço?
— Sim, mas o fazem com a rapidez do pensamento.
— O pensamento não é a própria alma em movimento?
— Quando o pensamento está em algum lugar, a alma também está ali, pois é a alma que pensa. O pensamento é um atributo.
90 — O Espírito tem consciência da distância que percorre ou é transportado instantaneamente?
— As duas coisas podem ocorrer. Ele pode perceber a distância, se quiser, ou fazê-la desaparecer completamente, dependendo de sua vontade e de seu grau de evolução.
91 — A matéria oferece resistência ao Espírito?
— Nenhuma. Eles atravessam tudo: o ar, a terra, a água e até o fogo.
92 — Os Espíritos possuem o dom da ubiquidade? Um Espírito pode dividir-se ou existir em vários lugares ao mesmo tempo?
— Um Espírito não pode se dividir, mas cada um é um centro que irradia para vários lados. Isso cria a aparência de estar em muitos lugares ao mesmo tempo. Assim como o Sol, que é um só, mas irradia sua luz em todas as direções.
— Todos os Espíritos irradiam com a mesma intensidade?
— Não. Essa força depende do grau de pureza de cada um.
Cada Espírito é indivisível, mas pode projetar seus pensamentos em várias direções sem se fragmentar. É nesse sentido que se entende a ubiquidade atribuída aos Espíritos.
Perispírito
93 — O Espírito não possui nenhum envoltório ou está sempre envolvido por alguma substância?
— Ele é envolvido por uma substância que, para vocês, é vaporosa, mas ainda densa para nós. É suficientemente sutil para elevar-se na atmosfera e deslocar-se livremente.
Assim como o germe de um fruto é envolvido por uma película, o Espírito é envolvido por um invólucro que chamamos, por analogia, de perispírito.
94 — De onde o Espírito retira esse envoltório semimaterial?
— Do fluido universal próprio de cada mundo. Por isso, ele não é idêntico em todos os globos. Ao passar de um mundo a outro, o Espírito troca de envoltório, assim como vocês trocam de roupa.
— Assim, quando os Espíritos de mundos superiores vêm ao nosso, assumem um perispírito mais denso?
— Sim. É necessário que se revistam da matéria do mundo que visitam.
95 — O envoltório semimaterial do Espírito tem forma definida e pode ser percebido?
— Sim. Ele assume a forma que o Espírito desejar. É assim que pode aparecer em sonhos ou em estado de vigília, podendo até se tornar visível e palpável.
Diferentes ordens de Espíritos
96 — Todos os Espíritos são iguais ou existe hierarquia entre eles?
— São de ordens diferentes, conforme o grau de perfeição que tenham alcançado.
97 — As ordens ou graus de perfeição dos Espíritos são em número fixo?
— Não. São ilimitadas, pois não há fronteiras rígidas entre elas. Ainda assim, podem ser agrupadas em três grandes categorias: Espíritos puros, Espíritos bons e Espíritos imperfeitos.
98 — Os Espíritos da segunda ordem têm poder para praticar o bem?
— Sim, de acordo com o grau de perfeição alcançado. Alguns possuem ciência, outros sabedoria ou bondade. Todos, porém, ainda passam por provas.
99 — Os Espíritos da terceira ordem são essencialmente maus?
— Não. Alguns não fazem nem o bem nem o mal; outros se comprazem no mal; há ainda os levianos, mais perturbadores do que perversos, que gostam mais da malícia do que da maldade e se divertem causando pequenas contrariedades.
Escala espírita
100 — Observações preliminares
A classificação dos Espíritos se baseia no grau de progresso que alcançaram, nas qualidades que já adquiriram e nas imperfeições das quais ainda precisam se libertar. Essa classificação, no entanto, não é absoluta. Cada categoria apresenta um caráter geral bem definido apenas quando observada em conjunto.
De um grau a outro, a transição é gradual e quase imperceptível. Nos limites, as diferenças se apagam, assim como acontece nos reinos da natureza, nas cores do arco-íris ou nas fases da vida humana. Por isso, é possível estabelecer maior ou menor número de classes, conforme o ponto de vista adotado. O mesmo ocorre com os sistemas de classificação científica, que podem ser mais ou menos completos, racionais ou práticos, sem que isso altere a essência da ciência.
Qualquer que seja o sistema adotado, o conteúdo permanece o mesmo. É natural, portanto, que os Espíritos tenham divergido quanto ao número de categorias, sem que isso tenha qualquer consequência real. Alguns se prendem a essas divergências aparentes sem refletir que os Espíritos não dão importância ao que é meramente convencional. Para eles, o pensamento é essencial; a forma, os termos e as classificações ficam a cargo dos seres humanos.
É importante não perder de vista que, entre os Espíritos, assim como entre os seres humanos, existem muitos que são ignorantes. Por isso, é preciso cautela ao supor que todo Espírito detenha conhecimento elevado. A classificação exige método, análise e compreensão profunda do assunto. No mundo espiritual, aqueles que possuem conhecimento limitado são tão incapazes de compreender um sistema geral quanto os ignorantes o são no mundo material.
Muitos Espíritos, por não conseguirem perceber gradações de saber, capacidade e moralidade, consideram como pertencentes à ordem mais elevada todos aqueles que lhes são superiores. Mesmo entre os que têm capacidade de análise, pode haver divergências de detalhes, conforme o ponto de vista adotado, especialmente quando se trata de uma divisão sem caráter absoluto.
Assim como Lineu, Jussieu e Tournefort propuseram métodos diferentes de classificação das plantas sem alterar a botânica em si, também aqui não se inventaram os Espíritos nem seus atributos. Eles foram observados e avaliados por suas palavras e ações, sendo depois classificados por analogia, com base nos próprios dados fornecidos por eles.
De modo geral, os Espíritos reconhecem três grandes categorias. Na última, situada na parte inferior da escala, estão os Espíritos imperfeitos, caracterizados pela predominância da matéria sobre o espírito e pela inclinação ao mal. Na categoria intermediária estão os Espíritos bons, nos quais o espírito prevalece sobre a matéria e há desejo sincero do bem. Por fim, a categoria superior reúne os Espíritos puros, que atingiram o grau máximo de perfeição.
Essa divisão se mostra lógica e bem delimitada. Restava apenas evidenciar, por meio de subdivisões, os principais matizes de cada conjunto. Foi o que se fez com o auxílio dos Espíritos, cujas orientações nunca faltaram.
Esse quadro permite identificar facilmente o grau de superioridade ou inferioridade dos Espíritos com os quais se entra em contato e, consequentemente, o nível de confiança e consideração que merecem. Ele funciona como uma chave para o entendimento da ciência espírita, pois explica as diferenças e aparentes contradições nas comunicações, esclarecendo as desigualdades intelectuais e morais entre os Espíritos.
É importante destacar, porém, que os Espíritos não pertencem de forma fixa a uma única classe. O progresso é sempre gradual e, muitas vezes, mais avançado em certos aspectos do que em outros. Assim, um Espírito pode apresentar características de diferentes categorias, algo que se torna perceptível por seus atos e sua linguagem.
Terceira ordem — Espíritos imperfeitos
101 — Características gerais
Predominância da matéria sobre o espírito. Tendência ao mal. Ignorância, orgulho, egoísmo e todas as paixões que deles decorrem.
Têm intuição da existência de Deus, mas não conseguem compreendê-lo.
Nem todos são essencialmente maus. Em alguns, há mais leviandade, impulsividade e malícia do que verdadeira maldade. Alguns não praticam nem o bem nem o mal; mas o simples fato de não fazerem o bem já revela sua inferioridade. Outros, ao contrário, sentem prazer no mal e se satisfazem quando encontram oportunidade de praticá-lo.
A inteligência pode estar associada à malícia ou à maldade. Ainda que alguns apresentem certo desenvolvimento intelectual, suas ideias são pouco elevadas e seus sentimentos, mais ou menos degradados.
Possuem conhecimento limitado sobre o mundo espiritual, e o pouco que sabem costuma se misturar a ideias e preconceitos da vida material. Por isso, só conseguem transmitir noções incompletas ou distorcidas. Ainda assim, mesmo em comunicações imperfeitas, o observador atento pode encontrar confirmações das grandes verdades ensinadas pelos Espíritos superiores.
A linguagem revela o caráter. Todo Espírito que manifesta pensamentos negativos em suas comunicações pertence à terceira ordem. Da mesma forma, todo pensamento mau que nos é sugerido tem origem em Espíritos dessa categoria.
Eles veem a felicidade dos bons, e essa visão lhes causa sofrimento constante, despertando sentimentos de inveja e ciúme.
Conservam a lembrança e a percepção dos sofrimentos da vida material, e essa impressão costuma ser ainda mais dolorosa do que a própria realidade vivida. Sofrem pelos males que suportaram e pelos que causaram aos outros. Como esse sofrimento se prolonga, acreditam que ele será eterno. Deus permite que pensem assim como forma de punição.
Podem ser divididos em cinco classes principais.
102 — Décima classe — Espíritos impuros
São inclinados ao mal, que se torna o centro de suas preocupações.
Como Espíritos, dão conselhos traiçoeiros, incentivam a discórdia e a desconfiança e se disfarçam de diversas maneiras para melhor enganar. Aproximam-se de pessoas de caráter frágil, propensas a ceder às suas sugestões, com o objetivo de induzi-las à queda moral. Sentem satisfação em retardar o progresso daqueles que fazem sucumbir às provas da vida.
Manifestam-se pela linguagem. A vulgaridade e a grosseria, tanto nos Espíritos quanto nos seres humanos, são sinais de inferioridade moral e, muitas vezes, intelectual. Suas comunicações revelam a baixeza de seus impulsos. Quando tentam enganar usando um tom sensato, não conseguem sustentar o papel por muito tempo e acabam se denunciando.
Alguns povos os transformaram em divindades maléficas; outros os chamaram de demônios, maus gênios ou Espíritos do mal.
Quando encarnados, os seres que eles animam tendem a todos os vícios gerados por paixões degradantes: sensualidade, crueldade, traição, hipocrisia, avareza e ganância. Praticam o mal por prazer, muitas vezes sem motivo, e, por ódio ao bem, escolhem frequentemente como vítimas pessoas honestas. São verdadeiros flagelos para a humanidade, independentemente da posição social que ocupem. O verniz da civilização não os livra da vergonha nem da desonra.
103 — Nona classe — Espíritos levianos
São ignorantes, brincalhões, irrefletidos e zombeteiros. Intrometem-se em tudo, respondem a tudo, sem se preocupar com a verdade. Gostam de causar pequenos aborrecimentos e alegrias passageiras, de confundir e enganar por meio de brincadeiras, truques e mistificações.
A essa classe pertencem os Espíritos popularmente conhecidos como duendes, gnomos ou diabretes. Estão sob a influência de Espíritos superiores, que muitas vezes os utilizam como auxiliares, assim como fazemos com servidores.
Em suas comunicações, a linguagem pode ser espirituosa e divertida, mas quase sempre superficial. Exploram falhas e ridículos humanos com ironia e sarcasmo. Quando usam nomes falsos, geralmente o fazem mais por travessura do que por maldade.
104 — Oitava classe — Espíritos pseudossábios
Possuem conhecimentos relativamente amplos, mas acreditam saber mais do que realmente sabem. Embora tenham feito algum progresso, sua linguagem aparenta seriedade e pode iludir quanto à profundidade de suas ideias.
Na realidade, suas comunicações refletem preconceitos e sistemas de pensamento que cultivavam na vida material. Misturam algumas verdades com erros graves, permeados por orgulho, presunção, inveja e teimosia, imperfeições das quais ainda não conseguiram se libertar.
105 — Sétima classe — Espíritos neutros
Não são suficientemente bons para praticar o bem, nem suficientemente maus para praticar o mal. Oscilam entre ambos e permanecem na condição comum da humanidade, tanto no aspecto moral quanto no intelectual. Mantêm apego às coisas materiais e sentem saudade dos prazeres grosseiros da vida terrestre.
106 — Sexta classe — Espíritos batedores e perturbadores
Esses Espíritos não constituem uma classe distinta por suas qualidades morais. Podem pertencer a qualquer das classes da terceira ordem. Manifestam-se principalmente por efeitos físicos e sensíveis, como pancadas, movimentos e deslocamentos anormais de objetos, agitação do ar e fenômenos semelhantes.
São mais ligados à matéria do que outros e parecem atuar como agentes das transformações dos elementos do globo, influenciando o ar, a água, o fogo, os corpos sólidos e até as camadas internas da Terra. Reconhece-se que tais fenômenos não têm origem puramente física quando revelam intenção e inteligência.
Todos os Espíritos podem produzir esses efeitos, mas os mais elevados geralmente delegam essas tarefas aos Espíritos inferiores, mais aptos às manifestações materiais do que às intelectuais.
Segunda ordem — Espíritos bons
107 — Características gerais
Predominância do espírito sobre a matéria; desejo sincero do bem.
Suas qualidades e capacidade de agir para o bem variam conforme o grau de progresso alcançado. Alguns se destacam pela ciência, outros pela sabedoria ou pela bondade. Os mais adiantados reúnem conhecimento e elevação moral. Como ainda não estão completamente livres da matéria, conservam, em maior ou menor grau, traços da existência corporal, perceptíveis na linguagem e em certos hábitos. Se assim não fosse, já seriam Espíritos perfeitos.
Compreendem Deus e o infinito e já experimentam a felicidade dos bons. São felizes pelo bem que fazem e pelo mal que conseguem impedir. O amor que os une é fonte de uma felicidade profunda, livre de inveja, remorso ou das paixões que atormentam os Espíritos imperfeitos. Ainda assim, precisam passar por provas até alcançarem a perfeição plena.
Como Espíritos, inspiram bons pensamentos, afastam os seres humanos do caminho do mal, protegem aqueles que se mostram dignos e neutralizam a influência dos Espíritos imperfeitos sobre os que não estão preparados para resistir.
Quando encarnados, são bondosos e benevolentes. Não se deixam mover por orgulho, egoísmo ou ambição. Não alimentam ódio, rancor, inveja ou ciúme e fazem o bem simplesmente pelo bem.
A essa ordem pertencem os Espíritos conhecidos popularmente como bons gênios, Espíritos protetores ou Espíritos do bem. Em épocas de ignorância e superstição, foram elevados à condição de divindades benéficas.
Podem ser divididos em quatro grupos principais:
108 — Quinta classe — Espíritos benevolentes
A bondade é sua principal característica. Sentem prazer em ajudar e proteger os seres humanos. No entanto, seus conhecimentos ainda são limitados. Avançaram mais no aspecto moral do que no intelectual.
109 — Quarta classe — Espíritos de ciência
Distinguem-se pela amplitude de seus conhecimentos. Interessam-se mais por questões científicas do que morais, para as quais demonstram maior aptidão. Ainda assim, encaram a ciência sob o prisma da utilidade e não são dominados por paixões próprias dos Espíritos imperfeitos.
110 — Terceira classe — Espíritos de sabedoria
Caracterizam-se por elevadas qualidades morais. Embora não possuam conhecimento ilimitado, têm discernimento suficiente para julgar com acerto os seres e as situações.
111 — Segunda classe — Espíritos superiores
Reúnem ciência, sabedoria e bondade. Sua linguagem é sempre digna, elevada e, muitas vezes, sublime. Sua superioridade os torna mais aptos a transmitir noções corretas sobre o mundo espiritual, dentro dos limites do que é permitido ao ser humano conhecer.
Comunicam-se de boa vontade com aqueles que buscam sinceramente a verdade e cuja mente já está suficientemente desprendida das preocupações materiais. Afastam-se, porém, dos que se movem apenas por curiosidade ou que se deixam dominar pelos interesses da matéria.
Quando, excepcionalmente, encarnam na Terra, cumprem missões de progresso e oferecem à humanidade um modelo de perfeição a que se pode aspirar neste mundo.
Primeira ordem — Espíritos puros
112 — Características gerais
Ausência de qualquer influência da matéria. Superioridade intelectual e moral absoluta em relação aos Espíritos das demais ordens.
113 — Primeira classe — Classe única
Percorreram todos os graus da escala e se libertaram completamente das impurezas da matéria. Tendo alcançado o máximo de perfeição possível às criaturas, não precisam mais passar por provas ou expiações. Não estando mais sujeitos à reencarnação em corpos perecíveis, vivem a vida eterna em comunhão com Deus.
Gozam de felicidade inalterável, pois não estão submetidos às necessidades nem às vicissitudes da vida material. Essa felicidade, porém, não é uma ociosidade monótona, nem uma contemplação passiva. São mensageiros e executores da vontade divina, responsáveis pela manutenção da harmonia universal.
Comandam os Espíritos que lhes são inferiores, auxiliam-nos em seu progresso e designam suas missões. Amparar os seres humanos em suas aflições, inspirá-los ao bem ou à reparação das faltas que os afastam da felicidade suprema é, para eles, fonte de profunda satisfação.
São conhecidos, em diferentes tradições, como anjos, arcanjos ou serafins.
Os seres humanos podem entrar em comunicação com eles, mas seria extrema presunção pretender tê-los constantemente à própria disposição.
Progressão dos Espíritos
114 — Os Espíritos são bons ou maus por natureza, ou são os mesmos Espíritos que se transformam?
— São os mesmos Espíritos que evoluem. Ao se melhorarem, passam de uma ordem inferior para outra mais elevada.
115 — Alguns Espíritos foram criados bons e outros maus?
— Deus criou todos os Espíritos simples e ignorantes, ou seja, sem conhecimento. A cada um foi dada uma missão, com o objetivo de esclarecê-los e conduzi-los progressivamente à perfeição, por meio do conhecimento da verdade, aproximando-os de Deus. É nessa perfeição que encontram a felicidade pura e eterna. Ao passar pelas provas que Deus lhes propõe, os Espíritos adquirem conhecimento. Alguns aceitam essas provas com humildade e chegam mais rapidamente ao destino final. Outros as enfrentam com revolta e, por isso, permanecem mais tempo afastados da perfeição e da felicidade prometida.
— Pelo que dizeis, os Espíritos, em sua origem, seriam como crianças: ignorantes e inexperientes, adquirindo pouco a pouco os conhecimentos de que precisam ao longo das diferentes fases da vida?
— Sim, a comparação é adequada. A criança rebelde permanece ignorante e imperfeita; seu progresso depende do grau de docilidade. A diferença é que a vida do ser humano tem fim, enquanto a dos Espíritos se estende indefinidamente.
116 — Existem Espíritos que permanecerão eternamente nas ordens inferiores?
— Não. Todos alcançarão a perfeição. A mudança ocorre, mas pode ser lenta, pois, como já dissemos, um pai justo e misericordioso não condena seus filhos para sempre. Acreditarias que Deus, tão grande, bom e justo, fosse pior do que os próprios seres humanos?
117 — O progresso mais rápido ou mais lento depende do próprio Espírito?
— Sim. Eles avançam mais ou menos rapidamente conforme o desejo que têm de progredir e a submissão que demonstram à vontade de Deus. Uma criança obediente não aprende mais rápido do que uma rebelde?
118 — Os Espíritos podem regredir?
— Não. À medida que avançam, compreendem o que os afastava da perfeição. Ao concluir uma prova, o Espírito conserva o conhecimento adquirido. Pode permanecer estacionado, mas nunca retrocede.
119 — Deus não poderia isentar os Espíritos das provas necessárias para alcançar a primeira ordem?
— Se Deus os tivesse criado perfeitos, eles não teriam mérito algum em desfrutar dessa perfeição. Onde estaria o mérito sem esforço? Além disso, a diversidade entre eles é necessária à individualidade de cada Espírito. Soma-se a isso o fato de que as missões exercidas nos diferentes graus da escala fazem parte dos desígnios da Providência para a harmonia do universo.
Assim como, na vida social, todos podem aspirar às mais altas funções, pode-se perguntar por que o governante de um país não faz de todos os soldados generais, ou por que todos os alunos não se tornam mestres. A diferença é que a vida social é limitada e nem sempre permite que o ser humano percorra todos os seus degraus, enquanto a vida espiritual é ilimitada e oferece a todos a possibilidade de alcançar o grau supremo.
120 — Todos os Espíritos precisam passar pelo caminho do mal para chegar ao bem?
— Pelo caminho do mal, não; pelo caminho da ignorância.
121 — Por que alguns Espíritos seguem o caminho do bem e outros o do mal?
— Eles não possuem livre-arbítrio? Deus não criou Espíritos maus; criou-os simples e ignorantes, com igual capacidade para o bem e para o mal. Aqueles que se tornam maus o fazem por escolha própria.
122 — Como podem os Espíritos, em sua origem, quando ainda não têm consciência plena de si mesmos, exercer a liberdade de escolher entre o bem e o mal? Existe neles alguma inclinação que os leve a preferir um caminho ao outro?
— O livre-arbítrio se desenvolve à medida que o Espírito adquire consciência de si mesmo. Não haveria liberdade se a escolha fosse determinada por uma causa externa à sua vontade. A causa não está no Espírito, mas fora dele, nas influências às quais ele cede por decisão própria. É isso que se representa simbolicamente na alegoria da queda do homem e do pecado original: alguns resistiram à tentação, outros cederam.
— De onde vêm essas influências?
— Dos Espíritos imperfeitos, que buscam dominá-lo e se alegram ao vê-lo cair. Foi isso que se quis simbolizar na figura de Satanás.
— Essa influência ocorre apenas no início da existência do Espírito?
— Ela o acompanha durante sua vida espiritual, até que alcance tal domínio sobre si mesmo que os Espíritos inferiores desistam de perturbá-lo.
123 — Por que Deus permite que os Espíritos possam escolher o caminho do mal?
— Como ousais questionar os atos de Deus? Julgais poder compreender seus desígnios? Pode-se, no entanto, afirmar isto: a sabedoria divina está na liberdade de escolha concedida a cada Espírito, pois assim cada um tem mérito por suas próprias ações.
124 — Se alguns Espíritos seguem desde cedo o caminho do bem e outros o do mal, devem existir gradações entre esses dois extremos, não?
— Sim, certamente. Os casos intermediários formam a imensa maioria.
125 — Os Espíritos que seguiram o caminho do mal poderão alcançar o mesmo grau de superioridade que os outros?
— Sim, mas levarão mais tempo.
Aqui, a expressão “eternidades” refere-se à ideia que os Espíritos inferiores fazem da duração de seus sofrimentos, cujo fim ainda não conseguem perceber. Essa impressão retorna sempre que fracassam em uma prova.
126 — Ao alcançar o grau supremo de perfeição, os Espíritos que passaram pelo caminho do mal têm menos mérito diante de Deus do que os outros?
— Deus ama igualmente os que se desviaram e os que seguiram o caminho reto. Aqueles são chamados maus apenas porque sucumbiram; antes disso, eram apenas Espíritos simples.
127 — Os Espíritos são criados iguais quanto às faculdades intelectuais?
— São criados iguais; porém, ignorando sua origem, é necessário que o livre-arbítrio siga seu curso. Progridem mais ou menos rapidamente, tanto em inteligência quanto em moralidade.
Os Espíritos que desde o início seguem o caminho do bem não são, por isso, Espíritos perfeitos. Não possuem más inclinações, mas ainda precisam adquirir a experiência e os conhecimentos necessários à perfeição. Podem ser comparados a crianças que, mesmo com bons instintos naturais, precisam se desenvolver e amadurecer. Da mesma forma, existem Espíritos que se inclinam ao bem ou ao mal desde a origem, com a diferença essencial de que o Espírito, ao ser criado, não é nem bom nem mau: possui todas as tendências e escolhe sua direção por meio do livre-arbítrio.
Anjos e demônios
128 — Os seres chamados anjos, arcanjos ou serafins formam uma categoria especial, de natureza diferente dos demais Espíritos?
— Não. São Espíritos puros, que alcançaram o mais alto grau da escala e reúnem todas as perfeições.
A palavra “anjo” costuma evocar a ideia de perfeição moral. No entanto, muitas vezes ela foi usada para designar indistintamente todos os seres incorpóreos, bons ou maus. Fala-se em anjo bom e anjo mau, anjo de luz e anjo das trevas. Nesses casos, o termo é sinônimo de Espírito ou gênio. Aqui, ele é empregado em seu sentido positivo.
129 — Os anjos percorreram todos os graus da escala?
— Sim. Alguns chegaram mais rapidamente, aceitando suas missões sem resistência; outros levaram mais tempo para alcançar a perfeição.
130 — Se é incorreta a ideia de seres criados perfeitos desde o início, como explicar que essa crença esteja presente na tradição de quase todos os povos?
— O mundo em que habitais não existe desde sempre. Muito antes de sua formação, já havia Espíritos que haviam alcançado o grau supremo. Os seres humanos acreditaram que eles sempre tivessem sido assim.
131 — Existem demônios, no sentido absoluto da palavra?
— Se existissem demônios nesse sentido, seriam obra de Deus. Mas seria Deus justo e bom se tivesse criado seres destinados eternamente ao mal e à infelicidade? Se há demônios, eles se encontram no mundo inferior em que viveis e em outros semelhantes. São homens hipócritas que transformam um Deus justo em um Deus vingativo, acreditando agradá-lo por meio das atrocidades que cometem em seu nome.
A palavra “demônio”, em sua origem grega daímōn, significava gênio ou inteligência e se aplicava aos seres incorpóreos, bons ou maus, sem distinção. A ideia moderna associa o termo exclusivamente a seres essencialmente maus.
Entender demônios como Espíritos eternamente maus é ilógico e contraditório. Deus, sendo soberanamente justo e bom, não poderia criar seres destinados ao mal perpétuo. Os chamados demônios são, na realidade, Espíritos imperfeitos, rebeldes às provas que lhes cabem, e que por isso prolongam seu sofrimento. Esse estado, porém, é transitório, pois todos podem sair dele quando assim o desejarem.
Satanás é a personificação alegórica do mal. Não se pode conceber um ser maligno lutando de igual para igual com a Divindade. Assim como os antigos personificaram o Tempo na figura de um velho com foice e ampulheta, os seres humanos representaram os Espíritos por imagens materiais para torná-los compreensíveis à imaginação.
Os anjos foram figurados como seres luminosos, com asas brancas, símbolo de pureza; Satanás, com chifres e garras, simbolizando as paixões inferiores. O povo, tomando essas imagens ao pé da letra, transformou alegorias em personagens reais.